Pagamento de valores que podem chegar aos 38 mil meticais, cerca de 500 euros, é condição imposta por agentes do SERNIC para abrir investigações. Denúncia é feita por cidadãos e confirmada pela sociedade civil.
Cidadãos em Maputo que já foram vítimas de roubo denunciam cobranças do SERNIC, Serviço de Investigação Criminal, para recuperar os bens furtados. Os valores a pagar, afirmam, dependem do tipo de bem roubado. Para recuperar uma viatura ligeira, por exemplo, o preço ronda o equivalente a 500 euros. Para computadores, aparelhagens ou telefones, os valores podem chegar ao equivalente a 30 euros. Tudo sem garantias: mediante o pagamento, alguns bens são recuperados, outros não.
Uma das vítimas, vamos tratá-lo por Filipe, conta que foi burlado por supostos agentes do serviço de transferência de dinheiro móvel M-pesa e, quando contactou o SERNIC, recebeu uma resposta insólita: "Como havemos de ir ao encontro dessa pessoa sem dinheiro de chapa [mini-autocarro]?", terão perguntado os agentes. "Eu não tinha dinheiro de chapa, porque eu fui meter a queixa. Disseram para nós irmos até [ao bairro] Maxaquene localizá-los", relata Filipe.
Outro cidadão, que identificamos como José, conta que a sua residência foi assaltada e roubaram vários bens. Quando foi apresentar queixa à polícia, os agentes foram à residência da vítima fazer a peritagem, mas pediam algo em troca: "A PIC [extinta Polícia de Investigação Criminal, atual Serviço de Investigação Criminal] ligou-me e começou a pedir-me dinheiro para investigar o caso. Foram 500 meticais, 1.000, 3.000 e vi que a cada dia que passava era dinheiro, mais dinheiro e acabei desistindo do processo", explica. "Alguns colegas disseram-me que o dinheiro para reaver os bens seria mais do que o que estão a cobrar e acabei desistindo do processo".
José diz ainda que a participação do caso à polícia só valeu a pena porque alguns dos seus bens estavam assegurados e foi ressarcido pela seguradora em dinheiro. O processo chegou ao tribunal e mais uma vez encontrou lá o SERNIC. "Há um jovem que me atende no tribunal e diz que alguém ia dar continuidade ao processo, mas que me ia indicar alguém das suas relações que me podia ajudar a reaver os bens", conta. "Mas essa pessoa que me ia encaminhar iria cobrar-me mais dinheiro, então desisti do processo".
"Perder tempo, dinheiro e dignidade"
A Sociedade civil repudia as atitudes do SERNIC e confirma que estes casos estão a tornar-se normais no seio da corporação que investiga vários furtos.
"Eu estou a ser roubada hoje, a ser violada hoje, e a polícia diz 'venha amanhã'. Primeiro, o dinheiro de chapa para ir à esquadra, dois, esse vir amanhã, 'senhora nós não temos dinheiro de chapa, de recarga para ligarmos, para investigarmos as pistas de quem roubou o telefone, a sua casa ou do violador'", lamenta a diretora executiva da MULEIDE, Mulher Lei e Desenvolvimento, Rafa Machava.
A ativista social não tem dúvidas: muitos casos que são investigados pela polícia não avançam, mesmo pagando aquilo que os agentes exigem. "Nem o seu problema vai andar, nem nada, você vai perder o seu tempo, dinheiro, dignidade, porque aquilo traumatiza. Você ir a uma autoridade para te ajudar e chegar lá e ser injuriada", afirma.
A DW África contactou o SERNIC para reagir a estas acusações, submetendo um pedido formal no dia 28 de maio. O SERNIC acusou a recepção do documento e a nossa reportagem insistiu para obter resposta, mas não tivemos nenhuma reação até ao fecho desta matéria.
No entanto, há sensivelmente um mês, o porta-voz do SERNIC na cidade de Maputo, Helder Lole, disse que têm estado a recuperar viaturas desde o início deste ano: "No cômputo geral, comparativamente ao ano transato, no mesmo período o SERNIC registou quase o mesmo número de furto de viaturas, estamos a falar de cerca de 40 viaturas furtadas, desde janeiro até à presente a data e em relação ao número de viaturas recuperadas registamos uma evolução, recuperámos mais viaturas neste período em relação ao período transato. Estamos a falar de 15 viaturas recuperadas este ano", garantiu.(x) Fonte:DW