O padre português Sílvio Moreira e o padre moçambicano João de Deus Gonçalves Kamtedz foram assassinados a tiro em 1985 por terem denunciado a violência durante a guerra civil em Moçambique.
A diocese de Tete, centro de Moçambique, vai iniciar o processo de canonização de dois padres jesuítas - um português e um moçambicano -, mortos na missão de Chapotera em 1985.
"Eram testemunhas dos acontecimentos e, evidentemente, tendo ligações com a igreja em Moçambique, com pessoas que tinham acesso ao poder", denunciaram "a violência, das duas partes. Por isso eram vozes incómodas", justifica Diamantino Antunes, bispo de Tete.
O padre português Sílvio Moreira e o padre moçambicano João de Deus Gonçalves Kamtedz foram assassinados a tiro e com baionetas a 30 de outubro de 1985 por um grupo armado que os tirou de casa, em Chapotera, na zona de Angónia.
Quase 36 anos depois, a igreja católica em Tete está numa fase preliminar do processo de canonização, acreditando que os dois missionários são "mártires". Eles "eram contrários à guerra e sentiam o sofrimento do povo como sofrimento deles", justifica o bispo de Tete.
Baseado nos relatos documentais e orais recolhidos em Moçambique e em Portugal, Diamantino Antunes sublinha as virtudes dos dois missionários que colocaram em risco a sua própria vida para ajudar a sepultar os mortos que encontravam espalhados, enquanto garantiam serviços de saúde, educação e outros.
"Eles decidiram: vamos ficar, custe o que custar. E naquela zona as pessoas ficaram enquanto os padres lá estavam. Mas depois da morte deles houve uma debandada generalizada para o Malawi", explicou o bispo.
Histórico da missão
Imediatamente a seguir à independência de Moçambique, em 1975, a vizinha missão de Lifidzi foi ocupada pela Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO) e os jesuítas aí residentes ficaram sem a grande igreja e as demais instalações da missão. Criar uma nova missão no lugar de Chapotera afigurou-se como alternativa.
Mas Diamantino Antunes referiu que o impacto da morte dos dois missionários se refletiu mesmo depois dos acordos de paz, em 1992, quando a população resistiu a regressar de imediato à região, por ainda recear a insegurança.
Os dois sacerdotes estavam em Chapotera há pouco mais de um ano, quando se deu o ataque, em 1985. Um comunicado de imprensa emitido na altura das mortes pela Companhia de Jesus indica que na noite de 30 de outubro um grupo armado levou os jesuítas para um lugar incerto.
Segundo o bispo de Tete, todas as informações recolhidas levam a crer que o alvo principal do ataque seria o padre João de Deus, que estava a traduzir a bíblia para a língua local.
A causa de canonização já teve o aval para avançar por parte da Companhia de Jesus e da Conferência Episcopal e aguarda outras consultas e pareceres, incluindo da Santa Sé. Um dos passos pretende verificar a inexistência de qualquer inconveniente ou impedimento devido ao contexto político: "Não queremos ajustar contas com ninguém, mas apenas - e o mais importante é isto - evidenciar o testemunho", diz Diamantino Antunes.(x) Fonte:DW