A prática de desporto feminino na província de Cabo Delgado, está a enfrentar um declínio preocupante, marcado pela escassez de apoio financeiro e infraestrutura. O que antes era uma atividade que incentivava a inclusão e mobilizava jovens de ambos os géneros, hoje encontra barreiras que desestimulam especialmente a participação de mulheres.
As dificuldades tornaram-se evidentes durante a 2ª Gala Provincial do Desporto, realizada em Pemba na última sexta-feira, 25 de Outubro de 2024, cujo lema, "Desporto Promovendo a Inclusão e Coesão Social", evidenciou o abismo entre a promessa de inclusão e a realidade da falta de apoio.
Em exclusivo à Zumbo FM Notícias, a responsável pela equipa do Núcleo Desportivo da Expansão, Lízia Marcela, descreveu a situação nas escolas e nos clubes como alarmante, sublinhando a necessidade de incentivos específicos para atrair mulheres ao desporto.
A carência de condições e o distanciamento da juventude feminina das competições refletem, segundo ela, a ausência de uma discriminação positiva para apoiar a participação feminina.
"Em nossas escolas, temos infraestruturas, mas aqui na nossa província há escolas que foram reconstruídas e ainda não têm essas infraestruturas. Antigamente, tínhamos muita adesão ao desporto, tanto de mulheres quanto de homens em geral, pois existia essa competição nas escolas, e a prática de Educação Física era obrigatória. Havia competição entre escolas e entre turmas. Fora disso, acho que deveria haver uma discriminação positiva em termos financeiros, incentivando os clubes – de várias modalidades – a incluir mulheres, oferecendo benefícios financeiros para clubes que concordem em ter uma equipa feminina. Isso também seria uma forma de colmatar essa lacuna", disse a responsável pela equipa do Núcleo Desportivo da Expansão.
Além disso, Marcela expôs os desafios únicos enfrentados pelas atletas femininas, ressaltando a necessidade de recursos financeiros para criar um ambiente que atenda às necessidades específicas das mulheres e incentivá-las a integrar equipas:
"Nós sabemos que a mulher tem necessidades específicas, diferentes das do homem. Não é o mesmo que trabalhar com homens; eles se adaptam facilmente a diversas situações. Com mulheres, é necessário outro tipo de tratamento. Sem recursos financeiros, é difícil atrair mulheres para o desporto, pois precisamos de condições para financiar clubes interessados em ter mulheres nas equipas. Seria preciso fornecer apoio que incluísse materiais de higiene e outras necessidades para motivá-las a participar", sublinhou Lízia Marcela.
A crise também se reflete no basquetebol feminino, conforme destacou a presidente da Associação Provincial de Basquetebol de Cabo Delgado, Lisete Almeida.
Almeida relatou as dificuldades que a associação enfrenta para organizar competições e manter o interesse de jovens mulheres devido à falta de patrocínio:
"Existem dificuldades em quase todos os lugares. Como associação, no início contávamos com nossos associados para o apoio, mas não é fácil, pois as próprias agremiações também têm dificuldades para se sustentar. Temos que buscar parceiros e apoios externos, mas, quando pedimos ajuda às empresas, a resposta é sempre a mesma: também enfrentam dificuldades. Sendo o basquetebol uma modalidade não muito popular, temos problemas com infraestruturas, e, por mais que consigamos organizar campeonatos, não temos condições de cobrar ingressos, pois não temos público, tornando tudo mais difícil", relatou em exclusivo à Zumbo FM Notícias.
Almeida revelou que, embora tenham conseguido realizar torneios em anos anteriores, a falta de apoio levou à interrupção do campeonato feminino deste ano, deixando evidente o quanto a modalidade sofre com a escassez de fundos.
"Fazemos um esforço, e até o ano passado (2023) conseguimos algum apoio para realizar o torneio regional sénior feminino em Cabo Delgado por dois anos consecutivos (2022 e 2023). Este ano, porém, não conseguimos, apesar do contacto da liga para retornarmos com a competição. Faltou apoio, e o campeonato teve de ser interrompido pela metade. Precisávamos pagar a iluminação do campo, os subsídios dos árbitros, mas não tínhamos condições. Por isso, o campeonato nem chegou ao fim. Este ano foi particularmente complicado."
A diminuição no número de equipas femininas inscritas também reflete o desânimo crescente entre as jovens atletas, como descreveu Almeida:
"Nos anos anteriores, tínhamos muitas equipas femininas e mais jovens participando. Este ano, infelizmente, apenas uma equipa feminina sénior se inscreveu, o que inviabilizou a realização do campeonato feminino, restando apenas o masculino. Parece que, a cada ano, a participação das mulheres no desporto diminui, e não sei por quê. Houve mais participação em anos anteriores, mas, recentemente, tem diminuído bastante."
No seu discurso, o Governador da Província de Cabo Delgado, Valige Tauabo, destacou a importância de dar visibilidade às entidades apoiadoras como forma de motivar ainda mais contribuições e permitir o fortalecimento do desporto local.
"Queremos chamar a atenção dos clubes: os clubes devem apresentar relatórios regularmente e, nesses relatórios, incluir quais são as entidades que lhes dão apoio, pois essas entidades, ao oferecerem suporte, estão contribuindo para a província. O sucesso dos clubes reflete-se em toda a província e além dela. Este reflexo diz respeito a todos nós, por isso, devem mencionar as entidades apoiadoras", referiu o Governador.
Tauabo rebateu as preocupações apresentadas pelos representantes dos clubes desportivos, afirmando que existe apoio que é canalizado para a modalidade desportiva.
"Podem surgir algumas entidades dizendo que estão a contribuir no anonimato, mas, se não for esse o caso, têm a obrigação de revelar. Não devem pensar que, ao nos informarem os nomes dos apoiadores, vamos nos direcionar a eles para que deixem de apoiar vocês e passem a apoiar-nos. O que queremos é que, quando chegar o momento de uma cerimónia de gala, possamos reconhecer e dar visibilidade a essas entidades, o que é muito importante. É só através dessa forma que podemos começar a mitigar a falta de apoio mencionada pela Dra. Marcela, que afirmou não saber o que está a acontecer – se antes havia apoio e agora não há – porque talvez esses recursos não estejam a chegar a todos os que realmente necessitam", rebateu o dirigente.
A ausência de suporte consistente e de condições adequadas continua a afastar as mulheres do desporto, e as declarações durante a gala reforçam a urgência de apoio e inclusão para preservar o desporto como uma via de desenvolvimento e coesão social em Cabo Delgado. (x)
Por: António Bote
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