A crise de segurança em Cabo Delgado continua a ser uma das mais desafiadoras para Moçambique. Desde 2017, o norte do país vive sob o impacto de uma insurgência terrorista que forçou milhares a fugir de suas casas e comprometeu a estabilidade de várias regiões. Mucojo, no distrito de Macomia, foi um dos principais focos de confrontos entre as Forças de Defesa e Segurança (FDS) moçambicanas contra os terroristas, num cenário de intensos ataques e uma luta constante pela segurança do território. Embora, nos últimos tempos, a situação tenha mostrado sinais de calma, especialmente com a presença de tropas internacionais, como as forças ruandesas, a paz ainda é frágil e a luta contra o terrorismo continua.
O apoio de tropas estrangeiras, especialmente dos militares ruandeses, foi inicialmente visto como uma luz no fim do túnel, oferecendo algum alívio para as forças locais e ajudando na estabilização da região. No entanto, o que deveria ser um reforço temporário à segurança local revelou-se, para muitos membros das FDS moçambicanas, um fator de intensificação das disparidades dentro da própria força de defesa nacional. O tratamento diferenciado entre os militares locais e os ruandeses tem gerado crescente frustração e desvalorização entre os soldados moçambicanos.
Em entrevista exclusiva à Zumbo FM Notícias, realizada no último sábado, 14 de Dezembro de 2024, uma fonte anônima das FDS em Macomia revelou, com grande preocupação, a sensação de abandono e marginalização vivida pelos militares moçambicanos. A fonte destacou que, enquanto as forças ruandesas recebem tratamento diferenciado, com recursos e condições logísticas superiores, as FDS locais são deixadas à mercê de condições precárias e, frequentemente, desvalorizadas.
“A Força ruandesa que está aqui é muito valorizada, em relação a nós. Somos os donos da casa, eles são os visitantes. Não tem como termos a mesma forma de tratamento”, relatou o militar, evidenciando o abismo que separa os dois grupos no terreno.
A preocupação vai além da questão emocional e psicológica das tropas. Ela se reflete também na falta de recursos essenciais, como água potável e alimentação. As FDS moçambicanas, responsáveis pela segurança diária da população, enfrentam dificuldades para suprir suas necessidades mais básicas. A fonte das FDS de Macomia revelou que as tropas ruandesas, ao contrário, têm acesso a água mineral, não sendo forçadas a beber da água local, considerada imprópria para consumo.
"Os ruandeses não bebem essa água, usam para lavar, tomar banho. Bebem água mineral. Nós, que não somos valorizados, saímos da localidade de Mucojo às 5horas de madrugada para buscar água de beber na vila sede do distrito de Macomia, com blindados, e, só chegamos às 14 horas", lamentou o militar.
A disparidade no tratamento reflete uma divisão preocupante entre as Forças de Defesa e Segurança moçambicanas e as tropas estrangeiras. A ausência de apoio logístico adequado para os militares moçambicanos coloca em risco não apenas a moral das tropas, mas também a capacidade de manter a estabilidade a longo prazo na região. A falta de condições mínimas para que as FDS desempenhem seu papel de forma eficiente compromete o progresso no combate ao terrorismo, em uma região que já enfrenta enormes desafios.
A realidade descrita pela fonte das FDS de Macomia é, portanto, um reflexo de uma crise mais profunda que ameaça a sustentabilidade das vitórias obtidas até agora na luta contra o terrorismo. As Forças de Defesa e Segurança de Moçambique, que têm sido a espinha dorsal no combate aos insurgentes, não podem continuar sendo tratadas como secundárias em sua própria terra. O tratamento desigual, a falta de recursos e o desrespeito por parte das autoridades não só prejudicam o moral das tropas, mas também levantam sérias questões sobre a confiança no sistema de segurança nacional e sua capacidade de garantir a paz duradoura em Cabo Delgado.
Além disso, a falta de reconhecimento da importância das FDS moçambicanas enfraquece a imagem do país perante a comunidade internacional, que espera ver um Moçambique unido na luta contra o terrorismo. As tropas ruandesas, em sua missão de apoio, devem ser valorizadas, mas isso não deve significar que as forças moçambicanas sejam desconsideradas ou deixadas em condições subumanas.
O governo moçambicano e as autoridades competentes precisam urgentemente abordar essas desigualdades, garantindo que as FDS moçambicanas recebam o devido respeito, reconhecimento e os recursos necessários para realizar suas funções com eficácia. Apenas com condições adequadas, apoio logístico e valorização, as FDS poderão garantir a segurança não apenas em Mucojo, mas em toda a província de Cabo Delgado, e, assim, contribuir de forma sólida para a estabilidade de Moçambique.
Em Mucojo, as Forças de Defesa e Segurança enfrentam uma batalha dupla: uma contra o terrorismo e outra contra as disparidades internas que minam sua capacidade de ação e sua dignidade. A desigualdade no tratamento, que persiste entre as forças nacionais e estrangeiras, é um dos maiores desafios para a manutenção da paz e da ordem na região, e sua resolução é crucial para que Cabo Delgado possa finalmente encontrar a paz duradoura que tanto almeja. (x)
Por: António Bote
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