"Os hospitais deveriam ter já contentores frigoríficos externos para precaver toda esta situação", alerta associação de funerárias.
Até ao início deste ano, desde que existem registos no Sistema de Informação dos Certificados de Óbito da Direção-Geral de Saúde (2009), apenas em dois dias - um deles em janeiro de 2017 e outro em agosto de 2018 - a mortalidade total em Portugal tinha ultrapassado a barreira dos 500 óbitos diários.
Agora, entre a última terça-feira e o último domingo, com o agravar da pandemia e com o frio, num mês que já costuma ter muita mortalidade, o limite das cinco centenas de mortes foi ultrapassado sempre durante sete dias consecutivos.
Carlos Almeida, presidente da Associação Nacional de Empresas Lutuosas, trabalha no setor funerário há cerca de 35 anos e admite à TSF que nunca tinha visto nada como estes últimos meses e em especial como a última semana.
Antes do pico deste início do ano, o Instituto Nacional de Saúde Dr. Ricardo Jorge (INSA) já tinha concluído que o ano de 2020 tinha terminado com uma sequência de 10 semanas com excesso de mortalidade - mais de dois meses -, cenário que se agravou, agora, em 2021.
Para dia 11 de janeiro, segunda-feira, os números da DGS ainda estão longe de fechados, mas, mesmo assim, o meio milhar de mortos também já foi ultrapassado.
O sistema de vigilância da mortalidade da DGS acrescenta que só nos últimos sete dias existiram 1.254 óbitos em excesso. Pelas contas da TSF, de 1 a 10 de janeiro faleceram 5.052 portugueses, mais 1.085 que na média dos cinco anos anteriores (2016 a 2020), sendo que apenas cerca de 200 óbitos não são explicados pela Covid-19, que nesse mesmo período matou 897 pessoas.
Funerárias pedem contentores frigoríficos
O representante das agências funerárias detalha que há muito que notam de "sobremaneira" este aumento da mortalidade que agora, neste início de ano, se deve não apenas à pandemia, mas também à sazonalidade natural dos óbitos que aumentam, por norma, nesta altura do ano.
Tudo tem sido agravado pelo extremo frio que se tem sentido, num pico de óbitos que, acredita, se pode prolongar por mais tempo.
"Há subidas nesta altura, mas não me lembro de nada com esta intensidade durante tanto tempo e penso que ainda não atingimos esse pico", refere Carlos Almeida, que diz que a capacidade do sistema "está muito no limite, pois, seguramente, já não existe capacidade de frio para a rapidez com que os cadáveres devem ser retirados dos grandes hospitais".
"Os hospitais deveriam ter já contentores frigoríficos externos para precaver toda esta situação", defende o representante do setor, que está convencido de que as câmaras de frio estão "superlotadas, existindo já, com certeza, muitos cadáveres que não chegarão a ir ao frio, ficando em salas com temperaturas mais reduzidas através de equipamentos de ar condicionado".
Funerais atrasados
A Associação Nacional de Empresas Lutuosas tem solicitado compreensão às famílias que não devem pedir, nesta altura de pandemia, cerimónias fúnebres mais complexas, nem a transferência dos cadáveres para cemitérios noutros concelhos - o que atrasa todo o processo -, e lamenta que os hospitais não permitam às funerárias terem acesso a determinados documentos, fundamentais para o funeral, por via eletrónica, sem se deslocarem ao hospital.
Os crematórios de Lisboa, por exemplo, estão com marcações para 48 a 72 horas mais tarde quando antes se faziam cremações em 24 horas.
"Um processo de funeral iniciado agora não faz com que o funeral aconteça 24 horas como os portugueses estavam habituados, o que vem marcar ainda mais as pessoas, pois é o prolongar de uma dor que não está resolvida", conclui o presidente da Associação Nacional de Empresas Lutuosas.(x) Fonte: TSF