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quarta-feira, 13 janeiro 2021 10:34

Cabo Delgado: A Tanzânia quer "uma fatia do bolo" do gás?

Plataforma de prospeção de gás na bacia do Rovuma. Foto ilustrativa Plataforma de prospeção de gás na bacia do Rovuma. Foto ilustrativa

Analista acredita que o vizinho de Moçambique está insatisfeito com o facto de o "bolo" todo do gás ter ido para Cabo Delgado. E alerta que, se não se garantir o "conforto" da Tanzânia, o conflito vai perpetuar-se.

O Presidente de Moçambique foi esta semana a Tanzânia procurar, com o seu homólogo, soluções para enfrentar um inimigo comum: o terrorismo.

"A Tanzânia está a dizer que prefere morrer connosco, não há outra alternativa. Foi isso que nós ouvimos [na visita] e isso nos encoraja", disse Filipe Nyusi depois do encontro com John Magufuli.

Contudo, a atuação deste ator, considerado absolutamente incontornável, é questionada, tanto no caso do apoio aos refugiados como no combate aos terroristas.

Será desta que Moçambique poderá, de facto, contar com o seu vizinho para viver em paz no norte?

O especialista em resolução de conflitos e políticas públicas Rufino Sitoe acredita que sim, "porque é uma cooperação projetada a partir do topo, o compromisso é maior quando é um Presidente a comprometer-se com outro".

Sitoe explica: "Penso que pode haver ações mais enérgicas nesse sentido. É possível que consigamos ganhos estratégicos importantes na contra-insurgência com esta cooperação, é uma das cooperações mais importantes ao nível da contra-insurgência, para cortar a movimentação deste grupo, ao nível de logística, porque está provado que é por terra e por mar [que chega o seu material]".

A mágoa da Tanzânia por causa dos investimentos do gás

Contudo, analistas desconfiam que o outrora considerado melhor vizinho de Moçambique prefere fechar os olhos e cruzar os braços no caso do terrorismo em Cabo Delgado por cobiça dos investimentos bilionários feitos na casa do vizinho Moçambique.

A ausência de Magufuli na tomada de posse de Filipe Nyusi denota alguma crispação, segundo a leitura de alguns setores.

O especialista em assuntos africanos Fernando Cardoso sublinha que "o Governo tanzaniano não está a fazer guerra a Moçambique, mas desde meados desta década está pouco contente com a questão do gás. Por outras palavras, a Tanzânia gostaria de ter sido objeto de investimentos que estão a ser feitos em Moçambique".

O académico português esclarece que "as multinacionais decidiram investir em Moçambique, porque é economicamente mais viável. Porque, no offshore, o fundamental das reservas de gás está em Moçambique, [apesar de ser] verdade que há bolsas de gás que entram no offshore em frente a Tanzânia. Então, o que se passa é que existe um mau relacionamento entre Moçambique e Tanzânia."

É preciso garantir o "conforto" da Tanzânia

Estará já o assunto a ser debatido entre Maputo e Dar-es-Salam? Não se sabe. Mas é um caso que, por enquanto, parece estar longe de ser tema dos comunicados da Presidência moçambicana.

Contudo, o especialista português defende que a solução passa por negociações com vista a dar a "fatia de bolo" que a Tanzânia supostamente quer.

"E como sabemos que as fronteiras são porosas e que também existem jihadistas no sul da Tanzânia, que operam contra os interesses e vontade do Governo da Tanzânia, é absolutamente fundamental que os dois governos, com o apoio de corporações multinacionais e de outros governos, se sentem e procurem chegar a uma situação em que a Tanzânia se sinta confortável com uma solução para aquilo que eles consideram também ser um interesse ou direito deles."

Se isso não acontecer, "vamos ver este conflito a aparecer e a desaparecer, a perpetuar-se naquelas zonas", alerta o académico.

Ajuda verdadeira da Tanzânia só mediante benefícios?

Daí a questão: se a Tanzânia não se beneficiar do investimento do gás moçambicano, considerado o maior de África no campo privado, vai cooperar genuinamente com Moçambique?

Rufino Sitoe, especialista em resolução de conflitos e políticas públicas, começa por lembrar que "os estados defendem os seus interesses, esse é o princípio das relações internacionais. Entre estados não há amigos nem inimigos, há interesses".

O analista argumenta ainda que, "se a Tanzânia consegue alcançar os seus interesses com esses atos, que podemos considerar de sabotagem aos projetos de exploração, obviamente que vai ter mais dificuldades de cooperar com Moçambique."

"Se for a tirar benefício, claro. Se a continuidade de violência gerar alguma negociação que favoreça a Tanzânia, obviamente que não vai estar interessado em colaborar com Moçambique", comenta Sitoe.(x) Fonte: DW

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