As primeiras vacinas contra o Sars-CoV-2 autorizadas para uso demonstraram ser altamente eficazes no combate à doença.
Apesar disso, ainda não sabemos se essas vacinas podem induzir imunidade esterilizante.
Espera-se que esses dados (que virão de testes em laboratório a partir das vacinas disponíveis) venham a público em breve.
Mesmo se a imunidade esterilizante for induzida inicialmente, isso pode mudar com o tempo, à medida que a resposta imunológica diminui e ocorre a evolução viral.
Imunidade a nível individual
Simplificando, significa que, se você entrar em contato com o vírus depois de ser vacinado, ele pode infectá-lo, mas você não terá sintomas - ou, se os tiver, serão leves.
Isso ocorre porque a resposta imune induzida pela vacina não impede totalmente a replicação de cada uma das partículas virais.
Um tipo particular de anticorpo conhecido como "anticorpo neutralizante" é necessário para gerar essa imunidade esterilizante.
Esses anticorpos bloqueiam a entrada do vírus nas células e evitam qualquer replicação. No entanto, para que eles possam atuar, o vírus infectante teria que ser idêntico ao vírus a partir do qual a vacina foi produzida.
O problema é que pesquisas recentes já indicam que mutações presentes nas variantes brasileira e sul-africana poderiam 'driblar' esses anticorpos neutralizantes, abrindo a possibilidade para quem já teve covid-19 ser reinfectado e colocando em dúvida, portanto a eficácia das vacinas, como disse o pesquisador Tulio de Oliveira em entrevista recente à BBC News Brasil.
Oliveira liderou a equipe que descobriu a nova cepa do coronavírus na África do Sul. Ele é diretor do laboratório Krisp, na escola de Medicina Nelson Mandela, na Universidade KwaZulu-Natal, em Durban, onde vive desde 1997.
Mas nem tudo está perdido.
Felizmente, nossa resposta imunológica às vacinas envolve muitas células e componentes diferentes do sistema imunológico.
Mesmo que a resposta do anticorpo não seja ideal, outros aspectos da memória imunológica podem ser ativados quando o vírus invade o corpo, como as células T e anticorpos não neutralizantes.
A replicação viral é lenta e, portanto, a doença será reduzida.
Sabemos disso por meio de anos de estudos com vacinas contra a gripe. Essas vacinas geralmente induzem proteção contra doenças, mas não necessariamente conferem proteção total contra infecções.
Isso se deve em grande parte às diferentes cepas de influenza que circulam, uma situação que também pode ocorrer com o Sars-CoV-2.
É reconfortante notar que as vacinas contra a gripe, apesar de não induzirem a imunidade esterilizante, ainda são extremamente valiosas no controle do vírus.
Imunidade na população
Na ausência de imunidade esterilizante, que efeito as vacinas contra o Sars-CoV-2 poderiam ter na disseminação do vírus?
E mais: se infecções assintomáticas forem possíveis após a vacinação, existe a preocupação de que o Sars-CoV-2 continue a infectar tantas pessoas quanto antes?
Primeiro, pessoas infectadas assintomáticas geralmente produzem vírus em níveis mais baixos.
Embora não exista uma relação perfeita, quando somos expostos a uma maior quantidade de vírus, temos sintomas mais graves da doença.
Portanto, pessoas vacinadas têm menos probabilidade de transmitir vírus em quantidade suficiente que possa causar sintomas graves da doença nos outros.
Experimentos usando uma vacina contra um vírus diferente em galinhas mostraram que, quando apenas parte de um grupo foi vacinada, as aves não vacinadas sofreram doenças mais brandas e produziram menos vírus.
Apesar de a imunidade esterilizante seja frequentemente o objetivo final do projeto de vacinas, ela é raramente alcançada.
Felizmente, isso não impediu que as vacinas reduzissem substancialmente o número de casos de infecções por vírus no passado.
Ao diminuirmos o número de pessoas doentes, a taxa de propagação do vírus também cai e, com sorte, a pandemia ficará sob controle.
Sarah L Caddy é pesquisadora em imunologia viral e cirurgiã veterinária na Universidade de Cambridge, no Reino Unido.(x)Fonte:BBC