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terça-feira, 06 julho 2021 08:36

MISEREOR: "Intervenção militar pode expandir o conflito em Cabo Delgado"

A União Europeia deverá oficializar, a 12 de julho, uma missão de treino militar para a província de Cabo Degado. Anabela Lopes, da MISEREOR, teme expansão da violência no norte de Moçambique.

A União Europeia (UE) deverá oficializar, no próximo dia 12 de julho, uma missão de treino militar para a província moçambicana de Cabo Degado. No entanto, esta é uma decisão que já mereceu criticas das duas principais organizações eclesiásticas de ajuda humanitária da Alemanha. A MISEREOR e a Pão para o Mundo entendem que, numa altura em que as causas da violência continuam por esclarecer, esta é uma intervenção que pode fazer "expandir" ainda mais o conflito na região.

Em entrevista à DW, Anabela Lopes, responsável da MISEREOR para Angola, Moçambique e Guiné-Bissau, explica que "uma intervenção militar em Moçambique numa altura em que não se sabem bem as causas da violência, pode expandir-se a toda a região". E acrescenta: "Não vemos que seja um apoio ao conflito em forma de tropas [que vá ajudar], pois não se sabe quem vai tirar proveito, uma vez que as violações são feitas pelos insurgentes e pelo exército. Será que é nesse exército onde a União Europeia quer investir o seu dinheiro?", questiona.

Para Anabela Lopes, a Alemanha deve "influenciar a União Europeia no sentido de não dar um apoio violento ao conflito", mas sim "apoiar a população local".

DW África: Porque estão a MISEREOR e a Pão para o Mundo contra os planos da União Europeia de avançar com uma missão militar em Moçambique? Quais são, a vosso ver, as consequências que daqui podem resultar?

Anabela Belo (AB): Uma intervenção militar em Moçambique, numa altura em que ainda se desconhecem as causas da violência que se vive neste momento, pode expandir-se a toda a região. Já em 2019, houve uma tentativa das organizações da sociedade civil de entenderem e discutirem a situação que se estava a viver naquela altura em Cabo Delgado. Ficou claro que não se tratava de um conflito religioso, mas sim de um problema de terra e de acesso a recursos naturais. O facto de se ter tentado dar uma solução a um problema sem conhecer as causas, pode levar a um aumento da violência na região.

DW África: Qual deve ser o papel da União Europeia no conflito? E da Alemanha?

AB: O papel de todo os países que fazem parte da Comunidade Europeia, devia ser no sentido de não dar um apoio violento ao conflito. Seria importante a União Europeia fazer mais esforços no apoio à população local, especialmente, às comunidades que estão a acolher estas famílias. Seria também importante que a União Europeia interviesse junto do Governo moçambicano, mostrando apoio, numa missão de investigação independente de forma a perceber as causas da situação atual. Deve-se rever os acordos de financiamento dos projetos de gás das empresas europeias. Acreditamos também que a União Europeia poderia assumir um papel de encorajar uma maior transparência e melhor acesso à informação. Perceber todo o envolvimento dos estados europeus assim como os contratos assinados entre os estados e o Governo moçambicano. Neste sentido, iniciar

negociações para um cessar de fogo entre o Governo moçambicano e os rebeldes, sob espécie de mediação internacional. Nós entendemos que se a UE se envolver no conflito, perde a capacidade enquanto organização neutral.

DW África: Ou seja, a União Europeia deve ter um papel mais de mediação...

AB: Sim, porque, de facto, pela experiência que se está a ter no Afeganistão ou no Mali, percebe-se que a intervenção militar não tem contribuído para solucionar os problemas nestes países. Não vemos que seja um apoio ao conflito em forma de tropas [que vá ajudar], pois não se sabe quem vai tirar proveito. As violações de direitos humanos são feitas tanto pelo lado dos denominados insurgentes, como por parte do exército. Será que é neste exército que a União Europeia quer investir o seu dinheiro? É tudo muito opaco.

DW África: A União Europeia iniciou este fim de semana a ponte aérea humanitária para a região. Este é um tipo de iniciativa que o Governo alemão deveria já apoiar?

AB: Qualquer forma de apoio que chegue diretamente à população, no sentido de aliviar o sofrimento, acesso a comida e medicamentos, no meio de uma pandemia, toda essa ajuda de emergência e humanitária é bem-vinda. Será uma iniciativa que nós apoiamos.

DW África: Qual tem sido o vosso papel na discussão desta missão da União Europeia em Moçambique?

AB: Neste momento, estamos a coordenar com outras organizações europeias, nomeadamente em Portugal, Finlândia, França, para tentar intervir junto dos deputados da UE, sabendo que não vamos ter influência na decisão que vai ser tomada no dia 12, mas pelo menos, tentar chamar a atenção dos perigos que existem nesta intervenção e não esquecer as necessidades da população local.

DW África: Continuam a chegar-vos relatos de atrocidades cometidas na província?

AB: Chegam relatos e fotos, infelizmente. Recebemos, estes dias, notificação de mais um ataque em Namande, Muidumbe. Os insurgentes atacaram um posto administrativo.(x) Fonte:DW

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