A PRM pode estar a violar o decreto sobre a Situação de Calamidade Pública ao deter pessoas que transgridem o recolher obrigatório.
Nas redes sociais, circulam depoimentos em áudio de cidadãos detidos pela Polícia da República de Moçambique (PRM) por terem violado o decreto sobre a Situação de Calamidade Pública, que estabelece medidas de prevenção da COVID-19. O mais recente é de um jovem encontrado com amigos numa casa a consumir bebidas alcoólicas.
“Encontraram-nos numa residência. Éramos sete pessoas. Eu fiquei três dias detido na esquadra de Mavalane. A polícia prendeu-me na sexta-feira, às 21 horas. Tentei negociar com os agentes e não consegui”, escuta-se no áudio.
Ficou três dias nas celas e a polícia confirma. O cidadão teve de pagar uma caução de 6.500 meticais ao Tribunal de KaMaxakene para ser solto.
O porta-voz da Polícia da República de Moçambique, ao nível da cidade de Maputo, Leonel Muchina, diz que o jovem “foi detido numa sexta-feira, tendo permanecido até segunda-feira quando foi encaminhada a legalização e veio a conhecer a soltura mediante o pagamento de uma caução”.
Contrariamente ao que a PRM faz, o decreto 50/2021, relativo à Situação de Calamidade Pública, no seu artigo 36 sobre desobediência, prevê que: “o desrespeito às medidas impostas pelo presente decreto é considerado crime de desobediência e punido com pena de 3 a 15 dias de prisão.”
Mas, aponta ainda o documento que: “a pena é sempre substituída por multa correspondente”.
Caso tal multa não seja paga voluntariamente pelo transgressor no prazo de 10 dias, aí sim: “o juiz ordena o cumprimento da prisão pelo tempo correspondente à razão de um dia de prisão efectiva por cada dois dias de multa”
Entrevistado pelo jornal “O País”, o advogado Mathe Júnior esclarece que, juridicamente, não há fundamentos para as detenções e acrescenta que a retenção de pessoas, que violam as medidas de prevenção da COVID-19, deve ser por um período máximo de seis horas.
“Olhando para as disposições do Código do Processo Penal e, de forma particular, a não obrigatoriedade da presença do arguido em julgamento, ou seja, o arguido pode ser julgado à revelia, sem nenhum problema, e também ao facto de que a pessoa não está a ser detida para ser apresentada ao julgamento ou ao primeiro interrogatório, porque não se aplica”, frisou o jurista.
Ademais, Mathe Júnior diz, ainda, que “os violadores das normas de prevenção da COVID-19 não devam ser detidas, porque a polícia devia identificar essas pessoas e, para isso, podem ficar retidas no posto policial ou numa esquadra, até ao máximo de seis horas, para que sejam devidamente identificadas e o processo encaminhado ao tribunal, para que sejam julgadas”.
O entrevistado vai mais longe ao afirmar que “não faz sentido nenhum deter uma pessoa que vai cumprir uma pena que deve ser obrigatoriamente convertida em multa”.
Mas, enquanto isso, a polícia diz que já não está numa fase de acções didácticas em relação aos que não cumprem o decreto.
“Fizemos isso durante largo tempo, fomos apelando e dizendo às pessoas que, de forma voluntária, deviam recolher-se à casa, usar máscaras e evitar venda de bebidas alcoólicas. Agora, todos aqueles que não cumprem, de forma rigorosa, as medidas de prevenção da COVID-19 vão conhecer uma mão dura das autoridades policiais”, avisou Muchina.(x) Fonte: OPais