Estas primeiras eleições depois da revolta popular de 2019 não devem trazer a mudança radical que muito iraquianos sonham. O país continua dividido ao longo de linhas étnicas e sectárias, continua a ser afectado pela violência de milícias armadas, e está cada vez mais dependente do vizinho Irão.
Dois anos depois da revolução popular que levou à queda do governo de Adel Abdul Mahdi, e que foi violentamente reprimida pelas autoridades, causando um enorme banho de sangue (700 mortos), 25 milhões de iraquianos vão hoje às urnas sem qualquer esperança que a mudança pedida – que o Estado providencie os serviços mais básicos, e o fim da corrupção generalizada, aconteça.
Concorrem a estas eleições 109 partidos políticos, agrupados em 21 coligações eleitorais. – é o novo parlamento que vai escolher os próximos primeiro-ministro e presidente.
São as quintas eleições no Iraque desde que a coligação internacional liderada pelos Estados Unidos derrubou o regime de Saddam Hussein em 2003. É certo que no último ano o parlamento iraquiano aprovou, entretanto, uma nova lei eleitoral que tenta quebra o monopólio que os partidos tradicionais tinham – antes os deputados eram escolhidos depois das eleições, de acordo com as percentagens dos partidos a nível nacional.
A nova lei eleitoral, que dividiu o país em 83 círculos, permite a eleição de candidatos independentes, mas a verdade é que se espera que os partidos tradicionais voltem a dominar o novo parlamento.
O mais provável é que as eleições resultem num impasse, e um prolongado período de negociação, porque não haverá uma maioria clara. Os partidos xiitas deverão continuar a dominar as eleições – o Iraque é predominantemente xiita, havendo uma minoria de cerca de 30% de sunitas.
O movimento do líder religioso xiita Muqtada al-Sadr, a aliança Saeroon, que luta para a expulsão de todas as forças estrangeiras, e que está ligado à poderosa milícia armada Jaish al-Mahdi, deverá continuar a ser o principal bloco no parlamento iraquiano, O segundo maior partido deverá ser a Aliança Fatah, comandada pelo líder paramilitar Hadi al-Amiri, pró-Irão.
Já os sunitas votarão na Aliança Taqaddom, do atual presidente do parlamento Mohammed al-Halbusi, ou na Aliança Azm, do milionário Khamis al-Khanjar.
Já o voto curdo irá ser repartido entre o Partido Democrático do Curdistão (KDP), que domina o governo em Erbil, e a União Patriótica do Curdistão (PUK), que controla a zona fronteiriça com o Irão. O Curdistão iraquiano é uma região autónoma desde 2005, e os partidos curdos acabam sempre por ser importantes para viabilizar governos centrais.
Desde a queda de Saddam Hussein que o sistema político iraquiano está baseado numa divisão de poderes, de acordo com linhas étnicas e sectárias, chamada de muhasasa (ou repartição, em árabe): o primeiro-ministro iraquiano é um xiita, o presidente do parlamento, um sunita, e o presidente, um curdo.
As últimas décadas têm sido turbulentas no Iraque. Anos de violência sectária seguiram-se à queda do regime de Saddam Hussein, e em 2014 uma parte substancial do país ficou sob controlo do grupo Estado Islâmico. A derrota deste movimento jihadista em 2017 levou às últimas eleições legislativas, e a um período de relativa segurança, mas uma serie de milícias armadas, muitas próximas do Irão, continuam activas em diversas províncias, este último país tem uma influência cada vez maior sobre Bagdade.(x) Fonte:RFI