Alexandre Chivale diz que decisões do tribunal no âmbito do processo das dívidas ocultas não condizem com a lei. Advogado ainda não foi informado pelo Ministério Público sobre os alegados crimes dos quais é suspeito.
Alexandre Chivale tornou-se num dos nomes mais comentados no meio jurídico e político em Maputo. O Ministério Público (MP) moçambicano abriu um processo contra o advogado porque teria encontrado indícios de que Chivale teria participado de esquemas de branqueamento de capitais e obstruído à justiça no caso das dívidas ocultas. O defensor de três réus também foi afastado do processo das dívidas ocultas pelo tribunal por alegada incompatibilidade de funções.
Enquanto suposto colaborador da secreta moçambicana, Chivale é, portanto, servidor público e não poderia opor-se ao Estado em tribunal. Além disso, o causídico supostamente representa interesses de uma empresa envolvida no processo, a Privinvest.
Nesta entrevista exclusiva à DW África, Alexandre Chivale fala sobre o processo movido pelo MP e o seu afastamento do caso das dívidas ocultas.
DW África: Cometeu os supostos crimes levantados pelo Ministério Público?
Alexandre Chivale (A.C.): Eu não tenho conhecimento destas acusações. Por este motivo, não tenho como comentar algo que desconheço em absoluto. Se me tivesse sido comunicado em algum momento, teria o prazer de - conhecendo os fundamentos, os contornos dessas suspeitas – poder emitir opiniões. Portanto, até aqui, o que sei é aquilo que [todos] veem nas redes sociais e nos órgãos de informação privado e público.
DW África: Também foi afastado do processo das dívidas ocultas pelo Tribunal Judicial da Cidade de Maputo alegadamente por incompatibilidade de funções. Concorda com os argumentos do tribunal?
AC: Não há como razoavelmente concordar com as posições do tribunal. Ainda bem que a Ordem dos Advogados de Moçambique (OAM) se posicionou, disse que é um manifesto ataque ao Estado de direto democrático, às liberdades e sobretudo ao direito à defesa – [no que tange] à possibilidade de alguém escolher livremente o advogado que o quer defender. Não vejo que haja como concordar com esta decisão. De tal sorte que interpusemos recurso e vamos ver qual é a decisão que será tomada.
DW África: A OAM já saiu em sua defesa, acusando o tribunal de usurpar as suas competências. O senhor Chivale também pretende agir para reverter a decisão do tribunal?
AC: Neste momento, a única reação que esbocei foi mesmo interpor o recurso, o que foi feito no próprio dia em que a decisão foi tomada. Se isso vai ou não reverter a decisão do tribunal... Bom, nós já temos muitas surpresas que não nos permitem fazer este tipo de prognóstico. Em várias situações, só para dar um exemplo, em que a lei claramente diz que boa parte dos arguidos que ali está não devia estar detido, mas está; quando se está numa situação em que por três vezes há claramente provas reconhecidas pelo tribunal de que a prisão preventiva está largamente expirada mas, mesmo assim, não se toma a decisão consequente com esta ilegalidade... Portanto, como disse, são várias situações que nos surpreendem. Mesmo quando a lei diz uma coisa e os tribunais tomam outra decisão.
DW África: Predomina o entendimento de que se trata de um julgamento político, tem a mesma percepção?
AC: No início do julgamento deste processo, em algum momento, eu teria dito que o próprio julgamento era uma oportunidade para o tribunal desmentir as alegações que fazíamos desde o princípio, segundo as quais, este era um processo de natureza política, com várias e gravíssimas interferências do poder político. O curso do julgamento tem-nos dado a dar razão. Infelizmente o tribunal não tem conseguido desmentir-nos. Nós temos esta posição cimentada desde o início em que este processo começou a ser instruído.
DW África: Que impactos tem o seu afastamento do processo para os seus constituintes?
AC: Se é meio do processo, em tão curto espaço de tempo, e se exige uma troca de advogado, isso obviamente vai comprometer muito o estado de espírito [do constituinte], a sua disposição para colaborar com o tribunal e, mais do que isso, a possibilidade de se defender como era de esperar-se. Eu sou advogado desse processo formalmente há mais ou menos três anos. Portanto, não é de um dia para outro que se pode trocar um advogado para ele perceber [o processo] primeiro e depois criar a confiança com os constituintes. E depois, o normal é que se desse algum tempo, o que não foi dado, para que as pessoas pudessem escolher. Em todo o caso, nós aguardamos com serenidade que a pessoa que for substituir obviamente possa agir em conformidade. Esta é a nossa expectativa. Mas, mais do que isso, o que me parece também é que mais de 90% do trabalho que era possível fazer nesse processo foi feito. E, portanto, iremos ver como é que isto vai terminar.(x) Fonte: DW