Quadros do Banco de Moçambique ouvidos ontem como declarantes no julgamento do caso “Dívidas não declaradas” disseram ao tribunal ter assinado as homologações das garantias e contratos de financiamento dos empréstimos porque sofreram pressão psicológica para o efeito.
Joana Matsombe, na altura administradora da área de Supervisão Bancária; Elsa Chambal e Telma Gonçalves, também do quadro de gestão do Banco Central, disseram ter sofrido forte pressão durante a tramitação dos processos de viabilização das garantias da PROÍNDICUS, EMATUM e MAM por alguns colegas com posições de chefia no banco. A pressão foi igualmente exercida por via de chamadas telefónicas feitas por pessoas alheias à instituição, como foram os casos de António Carlos do Rosário, director de Inteligência Económica do SISE; Isaltina Lucas, directora do Tesouro; e Eugénio Matlaba, um dos primeiros presidentes do Conselho de Administração da PROÍNDICUS.
No caso da declarante Joana Matsombe, disse que autorizou o empréstimo da EMATUM. Contudo, segundo ela, fê-lo como número três da hierarquia do banco, uma vez que Ernesto Gove, governador, e António Pinto de Abreu, vice, estavam de férias.
“Assinei por pressão e urgência. Fi-lo porque o colega e também administrador, Waldemar de Sousa, disse que era urgente e que havia pressão de fora. O processo não obedeceu aos procedimentos legais. Foi ‘sui generis’ porque não levou dois dias a tramitar, embora a sua complexidade exigisse mais dias. Por causa dessa pressão externa, o assunto tinha de ser célere e não levar muito tempo no banco”, explicou Matsombe.
Afirmou que não leu o contrato de financiamento da EMATUM porque não lhe cabia, mas sim aos técnicos na fase de análise. Por isso, agiu de boa-fé, confiando nos colegas, daí que simplesmente se limitou a autorizar o processo.
“Porque o expediente vinha com garantias emitidas pelo Ministério das Finanças e o contrato de financiamento assinado, o que era um facto consumado, ao Banco de Moçambique só competia fazer a sua parte, homologando o expediente e, sendo uma servidora pública, “limitei-me a autorizar, acreditando estar a agir de boa-fé e que o Estado estava comprometido com o assunto de segurança. Como era um assunto do Estado, a lei não se aplica. Na verdade, o processo nem deveria ter entrado no banco porque estava fora da lei”, explicou Joana Matsombe, sublinhando que em 42 anos de serviço no Banco de Moçambique nunca tinha visto algo igual e que lamenta ter estado naquela hora e data para assinar o expediente.
A declarante frisou que, uma vez que o processo vinha com descrição de confidencial e urgente, assim como se tratando de matéria de segurança do Estado, não se sentiu com competência para contrariar, tendo havido forças que ditaram que este processo devia avançar.
“Não podia fazer outra coisa, a menos que eu quisesse perder o meu pão. Nunca duvidei de algo que viesse do Estado”, disse a declarante.
Por sua vez, Elsa Chambal, uma das responsáveis de uma das divisões do Banco de Moçambique, disse que chegou a receber pressão de Eugénio Matlaba, presidente do Conselho de Administração da PROÍNDICUS; e de Isaltina Lucas, directora do Tesouro, para acelerar a aprovação dos expedientes da homologação das garantias.
“Numa das vezes recebi uma chamada em que Eugénio Matlaba dizia que estávamos a brincar com coisas sérias e o que nós devíamos fazer era simplesmente assinar a carta de autorização porque era urgente por se tratar de assunto de defesa e segurança. Isaltina Lucas também pressionou para que se assinassem os documentos. Efectivamente, ficámos convencidos de que havia um problema de segurança que era preciso resolver”, explicou Elsa Chambale.
“Isaltina Lucas, directora do Tesouro, perguntou o que estão a analisar se já estava tudo feito. Ligou a ameaçar para assinar o contrato, tudo com carácter de urgência. Concentrámo-nos mais na parte financeira do contrato e não nos equipamentos a serem fornecidos”, disse.
Elsa Chambal conta que o procedimento normal é receber os documentos no balcão do Banco de Moçambique mas, para este caso, foram instruídos a receber uma pessoa do SISE ou do Ministério da Defesa no gabinete, o que elevou a pressão.
Já a declarante Telma Gonçalves, na altura chefe de Serviços no Departamento de Estrangeiro do Banco de Moçambique, disse que sofreu muita pressão do réu António Carlos do Rosário, pessoa que tinha levado pessoalmente o expediente da EMATUM para obter homologação.(x) Fonte: Jornal Noticias