Estradas cortadas, enchentes nas paragens e atos de vandalismo marcaram as primeiras horas da paralisação dos taxistas em Luanda, com destaque para o distrito de Benfica onde foi incendiado o comité distrital do MPLA.
Pelas 06:00 eram visíveis nos bairros dos Zangos 2 e 3 e no Cacuaco, "paragens apinhadas" e filas de táxis azuis e brancos, transportes coletivos também conhecidos como “quadradinhos” e “candongueiros, hoje parados devido à greve convocada por três associações de taxistas.
Alguns taxistas impediram outros colegas de trabalhar e alguns "lotadores" (jovens que se encarregam de lotar o táxi e preencher todos os lugares disponíveis) foram ameaçados e forçados a partir vidros e furar pneus das viaturas para que estas não pudessem circular.
Vídeos e fotografias postas a circular nas redes sociais mostram um cenário caótico em alguns pontos da cidade, com destaque para o que se vive no distrito urbano de Benfica, mais afastado do centro da cidade, onde um grupo de jovens incendiou bandeiras do MPLA e o edifício do comité distrital do partido que governa Angola há 46 anos.
O secretário Provincial do MPLA em Luanda, Bento Bento, diz que a vandalização da infraestrutura do partido é uma ação premeditada.
"O que é que uma greve de taxistas tem a ver com as instalações políticas. Trata-se de um plano inteligentemente elaborado. Aliás, desde algum tempo temos vindo a denunciar que há intenções de indivíduos que pretendiam atacar comités do MPLA e hoje está aí a prova", afirmou Bento Bento à imprensa.
Detidos 17 suspeitos
Pelo menos 17 pessoas estão detidas e vão a julgamento sumário, segundo o porta-voz do Comando Provincial da Polícia Nacional em Luanda, Nestor Goubel.
Populares estão a percorrer longos quilómetros para se fazerem em diferentes destinos. Benfica, Cacuaco e Viana são as regiões onde o protesto está mais aceso com registo de queima de pneus nas estradas.
Os taixstas não estão a permitir que carros particulares transportem os passageiros, conforme constatou a DW África no município do Talatona.
O segundo secretário municipal da Associação Nova Aliança dos Taxistas de Angola (ANATA) no Talatona, Flay Lourenço André, ninguém pode exercer as funções dos taxistas que estão em greve.
"Como taxista estou a reivindicar um direito que é meu. Não estamos a impedir os que por exemplo, veem buscar uma irmã ou irmão na paragem. Estamos a impedir aqueles que querem levar passageiros para depois cobrar. Quer dizer, querendo ou não, está também a fazer o trabalho de táxi e nós, como taxistas, hoje estamos parados", explicou o membro da ANATA.
"O povo está a sofrer"
Um jovem, que se identifica como Jorge, foi abrigado a descer de uma viatura. Explica que foi forçado a faltar o trabalho e acrescenta: "o povo está a sofrer".
"A escassez de táxi está a complicar de tal forma que não conseguimos chegar a um quilómetro de distância. Tem que se rever isso, porque o que ouvimos nos noticiários é que houve um acordo. Vemos que foi um acordo teórico porque, na prática, as pessoas estão a sofrer. Só quem vive isso sente", lamenta.
Jornalistas retirados à força
Jornalistas dos canais TV Zimbo e TV Palanca sofreram uma tentativa de linchamento quando reportavam os incidentes ocorridos em Luanda.
"Quando nos aproximámos do local para filmar, alguns indivíduos tentaram retirar-nos à força, mas um outro grupo solidarizou-se e tentou escoltar-nos até à esquadra", contou Telmo Gama, da TV Zimbo, que se encontrava com um colega, repórter de imagem, em Benfica, nos arredores de Luanda, para acompanhar os tumultos desta manhã.
Telmo Gama sublinhou que o momento de maior apreensão aconteceu quando ouviu alguém gritar "não atira combustível".
O jornalista da Zimbo adiantou que não conseguiu identificar os agressores, mas indicou que "não são taxistas", o que lhe foi confirmado também pela polícia.
"Presume-se um aproveitamento da situação para praticar atos de vandalismo e destruição de bens públicos", sublinhou, acrescentando que "as pessoas estavam com os nervos à flor da pele".
Na esquadra para onde se dirigiu a equipa da TV Zimbo encontravam-se já colegas da Palanca TV que foram também vítimas de ameaças e tentativa de linchamento.
Entretanto, o coordenador de conteúdos da Comissão de Gestão da TV Zimbo, Amílcar Xavier, já repudiou o "ato de intolerância".
"Somos apenas mediadores do espaço público. Estamos apenas a exercer o nobre papel que é o de servir a causa pública", disse à Lusa, sublinhando que estes atos devem ser condenados por toda a sociedade.
Intervenção do PR, pede a CASE-CE
A CASA-CE, segunda maior força da oposição angolana, apelou esta segunda-feira, (10.01), ao Presidente da República que oriente as entidades competentes a viabilizarem, "mediante justa negociação", o fim da greve de taxistas que hoje arrancou em Luanda.
Num comunicado, a Convergência Ampla de Salvação de Angola – Coligação Eleitoral (CASA-CE) manifestou enorme preocupação com o início da greve de taxistas, contrariando informações divulgadas por alguns meios de comunicação social.
No documento, a CASA-CE sublinha os efeitos nefastos e imediatos da greve dos taxistas na economia nacional, nas empresas, na vida dos angolanos e das suas famílias.
“Atento à onda de insatisfação latente no seio dos cidadãos, o colégio presidencial da CASA-CE condena com veemência os atos de vandalismo praticados hoje contra bens públicos e privados, em Luanda, e exorta patrioticamente os angolanos a manterem a serenidade e a encararem com elevado sentido de responsabilidade à caótica situação de mobilidade pública que se assiste, evitando qualquer tipo de atitude que promova a violência, o vandalismo e a consequente perturbação da ordem e da tranquilidade públicas”, refere a CASA-CE.
UNITA fala em "insensibilidade do Executivo em dialogar"
O grupo parlamentar da UNITA, maior partido da oposição, condenou veementemente os atos de violência. Numa nota, disse que constata com enorme preocupação o agravamento da crise económica e social no país, com o registo de mortes por forme, elevados índices de miséria extrema, desnutrição, criminalidade, prostituição e violência doméstica, resultantes do fracasso das políticas públicas que têm obrigado os cidadãos, individual e coletivamente, a protestarem.
A preocupação é acrescida, sublinha o grupo parlamentar, por constatar "insensibilidade do Executivo em dialogar com representantes legítimos de distintas classes de trabalhadores e a incapacidade de implementação de medidas de políticas com impacto direto na vida do cidadão, das famílias e das empresas".
Segundo o grupo parlamentar, esta "insensibilidade" das autoridades "tem gerado o crescente movimento grevista, atingindo os médicos, enfermeiros, professores universitários, oficiais de justiça, trabalhadores da EPAL, ENDE [empresas de distribuição de água e energia] e o mais recente dos taxistas", cuja paralisação destes últimos gerou hoje "atos de violência nalgumas artérias da cidade de Luanda".
E no comunicado, "o grupo insta as entidades que tutelam os setores hoje em greve a abrirem-se ao diálogo e à concertação, única via capaz de ajudar a resolver as preocupações das classes socioprofissionais".(x) Fonte:DW