O ranking da corrupção é liderado pela Polícia da República de Moçambique (PRM), segue-se o sector da Justiça e, em seguida, o da Educação. Não obstante as perdas, o Estado moçambicano recuperou, no ano passado, cerca de 734.5 milhões de Meticais resultantes do crime. O montante é referente a bens como viaturas, imóveis e de dinheiro.
A corrupção continua uma pedra no sapato das autoridades judiciárias, porque os funcionários e agentes do Estado continuam a beneficiar-se de facilidades para dilapidar o erário público em prejuízo do país. Em resultado disso, ano passado, houve aumento de casos de corrupção, o que lesou o Estado em mais de 300 milhões de Meticais.
“Continuamos a registar um número significativo de processos envolvendo servidores públicos, que, valendo-se das suas funções, obtêm benefícios indevidos ou apropriam-se de recursos materiais e financeiros colocados sob a sua administração, em prejuízo do interesse público. Analisados os processos tramitados, constatamos que, no ano de 2021, o sector da Polícia da República de Moçambique foi o que registou maior número de processos, com 73, seguido do sector da Justiça, com 42; da Educação, com 39; da Saúde, com 24; do Serviço Nacional de Migração (SENAMI), com 17; e da Autoridade Tributária de Moçambique (AT), com 14. Em resultado de actos de corrupção, além de prejuízos para a imagem e credibilidade, no período em análise, o Estado foi lesado em cerca de 303. 445.601, 7 MT (Trezentos e três milhões, quatrocentos e quarenta e cinco mil, seiscentos e um meticais e sete centavos), contra 556. 293.879, 01 (quinhentos e cinquenta e seis milhões, duzentos e noventa e três mil, oitocentos e setenta e nove meticais e um centavo)”, referiu.
RECUPERADOS MAIS DE 700 MILHÕES DE METICAIS DAS MÃOS DE CRIMINOSOS
Não obstante o rombo sofrido, o Estado conseguiu recuperar activos resultantes do crime. São eles bens imóveis, viaturas e valores monetários. “No ano 2021, o Gabinete Central de Recuperação de Activos (GCRA) recebeu 10 pedidos de intervenção, que deram lugar a igual número de processos de investigação patrimonial e financeira. Somados aos cinco processos transitados do período anterior, totalizaram 15, tendo sido concluídos quatro, e 11 continuam em investigação”, disse a procuradora para, em seguida, detalhar que “no âmbito dos processos-crime tramitados, a nível nacional, apreendemos 104 viaturas, 44 imóveis, valor monetário de 205.842.003,22 Meticais e outros bens. Do total dos bens apreendidos, foram avaliadas 18 viaturas, em 10.035.925,00 Meticais, 17 imóveis, em 481.712.900,00 Meticais e outros bens em 36.980.480,00 Meticais. Prossegue o processo de avaliação das restantes 86 viaturas e 27 imóveis”, detalhou.
Beatriz Buchili referiu que, em resultado do funcionamento do Gabinete Central de Recuperação de Activos, houve aumento de bens apreendidos, sendo que “em 2021, o valor total dos bens apreendidos foi de 734.571.308,22 Meticais contra os 614.932.008,85 Meticais, do ano 2020, representando um aumento em 19 por cento”.
ADVOGADOS E MAGISTRADOS ENVOLVIDOS NOS RAPTOS DO PAÍS, DIZ PGR
Sobre os raptos, a Procuradora-Geral mostrou preocupação com o aumento de casos, o que coloca em causa a imagem do país e retrai o investimento estrangeiro.
“Essa situação tem criado um sentimento de insegurança para os cidadãos, em especial as vítimas que continuam reféns, mesmo após a sua libertação física, sendo constantemente chantageadas para pagamento de valores como de uma dívida se tratasse, especialmente nos casos em que não tenham pago na totalidade o valor de resgate. Durante o ano passado, registamos 14 processos contra 18 do igual período do ano anterior, verificando-se uma redução de quatro processos.”
Sem apresentar números, Buchili trouxe a novidade da participação de advogados e outros actores do judiciário neste tipo de crime, o que torna a investigação mais difícil e complexa. “O envolvimento de alguns membros da corporação, ou sectores ligados ao tratamento desta matéria, tais como o SERNIC, PRM, advogados e até magistrados, bem como de outros actores do judiciário, cria fragilidades na investigação e instrução dos respectivos processos, além de perigar a segurança daqueles servidores públicos que estão comprometidos com o combate ao crime. Nos estabelecimentos penitenciários, registam-se situações de funcionários que facilitam a introdução e uso de telemóveis ou outros aparelhos electrónicos pelos reclusos, alguns dos quais envolvidos em raptos”.
AGENTES DO SENAMI AJUDAM ENTRADA DE CRIMINOSOS, DIZ BUCHILI
Beatriz Buchili apontou, ainda, a corrupção de agentes e as fragilidades das fronteiras como causas do recrudescimento da criminalidade no território nacional.
“A violação das nossas fronteiras, por cidadãos estrangeiros, alguns dos quais munidos de passaportes e até de Bilhetes de Identidade, emitidos pelos serviços de migração e de identificação civil, com recurso a esquemas de corrupção, concorre para o aumento do crime organizado, colocando em causa a soberania do nosso Estado. Esse crime vem ganhando expressão no nosso país, tendo como principais portas de entrada as províncias de Tete e Cabo Delgado, recorrendo, normalmente, às vias terrestres e marítimas, respectivamente. Mais grave ainda é o envolvimento de funcionários públicos e uso de viaturas do Estado para o transporte ilegal de imigrantes na tentativa de escaparem do controlo as autoridades. Estas condutas podem contribuir, sobremaneira, para a entrada de indivíduos ligados à criminalidade violenta e organizada, como o tráfico de armas, de droga, imigração ilegal e drogas, imigração ilegal e terrorismo, comprometendo a paz, a soberania nacional e o desenvolvimento socioeconómico.”
Quanto ao terrorismo no país, disse que, no ano passado, foram registados 354 processos-crime, sendo 23 com 57 arguidos em prisão preventiva e quatro, com igual número de arguidos, em liberdade. Os restantes 327 processos correm contra desconhecidos.
“Em conexão com as acções terroristas, foram detidos 57 indivíduos, dos quais 46 homens e 11 mulheres, cuja faixa etária varia dos 19 a 65 anos de idade, sendo 54 moçambicanos, um burundês, um etíope e um tanzaniano. Foram julgados e condenados 48 arguidos, em quatro processos, sendo 12 de nacionalidade iraniana e 36 moçambicanos, tendo sido aplicadas penas que variam de 10 a 24 anos de prisão. O combate ao terrorismo pressupõe a prevalência de medidas preventivas sobre as reactivas, envolvendo diversos segmentos da sociedade, como instituições financeiras e entidades não financeiras, confissões religiosas, estruturas comunitárias e organizações da sociedade civil.”
Beatriz Buchili anunciou que há novos arguidos num outro processo autónomo sobre as “dívidas ocultas” e reiterou que a Procuradoria-Geral da República continuará a lutar para extraditar Manuel Chang para Moçambique.
“No que se refere ao outro processo autónomo, registado sob o n.º 372/11/P/2020, contra outros agentes suspeitos de se terem beneficiado de dinheiro ou bens relacionados com as dívidas em causa, prossegue a instrução preparatória, na Procuradoria-Geral da República – Cidade de Maputo, com sete arguidos já constituídos, os quais se encontram em liberdade, sendo que quatro, em parte incerta. Reiteramos o nosso posicionamento inicial de que Moçambique é o único país com jurisdição para exercer acção penal sobre o caso em apreço e que, consequentemente, todos os envolvidos devem responder perante as autoridades moçambicanas. Por isso, tal como acima referido, a extradição de Manuel Chang e de outros arguidos, que temos estado a solicitar, reveste-se de extrema importância, por se tratar de sujeitos processuais fundamentais para o esclarecimento dos factos, dada a sua participação no caso em investigação”, precisou.
Ainda no informe, Beatriz Buchili mostrou preocupação com o aumento de processos contra magistrados, oficiais de Justiça e assistentes de oficiais de Justiça do Ministério Público e dos tribunais.(x) Fonte: OPais